(Fragmento de "O
Mundo de Sofia”, Jostein Gaarder, 1991)
Hilde acomodou-se
confortavelmente no banco de balanço , ao lado de seu pai. Era quase meia-noite.
Os dois olharam para a baía. No céu as primeiras estrelas começavam a aparecer
palidamente. Sob o ancoradouro, pequenas ondas batiam contra as pedras.
Foi seu pai quem quebrou o silêncio:
- É um mistério pensar que vivemos num pequeno planeta em algum ponto do universo.
- Sim...
- A terra é um dos muitos planetas que orbitam ao redor do Sol. Mas nosso planeta é o único em que há vida.
- E talvez o único em todo o universo?
- Sim, é possível. De outro lado, também é possível que haja vida pulsando por todo o universo. Isto porque o universo é incomensuravelmente grande. As distâncias são tão grandes que as medimos em minuto e em anos-luz.
- O que vem a ser isto?
- Um minuto-luz é a distância que a luz percorre em um minuo. E isto é muito, pois no espaço sideral a luz percorre trezentos mil quilômetros em um segundo. Um minuto-luz é portanto, sessenta vezes trezentos mil, ou dezoito milhões de quilômetros. Um ano-luz são aproximadamente nove trilhões e meio de quilômetros.
- Qual é a distância até o Sol?
- Pouco mais de oito minutos-luz. Os raios do Sol, que nos aquecem o rosto num dia quente de junho, viajaram oito minutos no universo até chegarem a nós.
- Continue.
- Plutão, o planeta mais longínquo de nosso sistema solar, está a mais de cinco horas-luz da Terra. Quando um astrônomo observa Plutão com seu telescópio, na verdade ele volta cinco horas no seu tempo. Isto é o mesmo que dizer que a imagem de Plutão leva cinco horas para chegar até nós.
- Não é fácil imaginar como isso é possível, mas acho que entendo o que você está dizendo.
- Muito bem, Hilde. Aqui na Terra, nós estamos apenas começando a aprender a nos orientar. Nosso sol é uma das quatrocentos bilhões de outras estrelas que existem numa galáxia que chamamos de Via-Láctea. Esta galáxia se parece com um grande disco com muito braços espiralados e nosso sol fica num desses braços. Quando olhamos o céu estrelado numa noite clara de inverno, vamos um largo cinturão de estrelas, isto porque estamos olhando para o centro da Via-Láctea.
- Deve ser por isso que em sueco a Via-Láctea também é chamada de "jardim de inverno".
- A distância até nosso vizinho mais próximo na Via Láctea é de quatro anos-luz. Talvez seja aquela estrela que você esteja vendo brilhar sobre aquela pequena ilha lá em baixo. Imagine que há um observador naquela estrela com um telescópio de grande potência voltado para Bjerkely; nesse caso. ele estará vendo Bjerkely tal como era a quatro anos. E é possível que ele esteja vendo uma garotinha de onze anos sentada neste mesmo balanço com os pés sem tocar o chão.
- Inacreditável...
- E estamos falando apenas de nosso vizinho mais próximo. Toda a galáxia, ou "nebulosa", como também a chamamos, tem noventa mil anos-luz de largura. Isto significa que a luz leva todos esses anos para ir de uma ponta a outra da galáxia. Quando vemos uma estrela na Via-Láctea que está a cinquenta mil anos-luz de distância do Sol, estamos enxergando o passado, há cinquenta mil anos.
- Este pensamento é grande demais para uma cabeça pequena como a minha.
- Quando observamos o universo, na verdade estamos olhando o passado. E não nos resta outra saída. Nunca saberemos como o universo está agora. Quando olhamos para uma estrela lá no alto, a milhares de anos-luz da Terra, na verdade estamos viajando rumo a um passado que está a milhares de anos na história do universo.
- Isto é uma coisa absolutamente inimaginável.
- Mas tudo o que vemos chega aos nossos olhos como ondas luminosas. E essas ondas levam certo tempo para atravessar o espaço e chegar até nós. Podemos comparar isto com o trovão. Sempre ouvimos o trovão algum tempo depois de termos visto o relâmpago. E isto se explica porque as ondas sonoras são mais lentas do que as ondas luminosas. Quando ouço um trovão, na verdade estou ouvindo o ruído de algo que já aconteceu a pouco tempo atrás. O mesmo ocorre com as estrelas. Quando olho para um estrela lá no céu, que está a milhares de anos-luz da Terra, na verdade estou "vendo o trovão" de algo que aconteceu no passado, neste caso há milhares de anos.
- Entendo.
- Mas até agora só falamos de nossa própria galáxia. Os astrônomos acreditam que haja cerca de cem bilhões de galáxias no universo, e em cada uma dessas galáxias, por sua vez, existem centenas de bilhões de estrelas. A galáxia mais próxima da Via Láctea é a nebulosa de Andrômeda. A nebulosa de Andrômeda está a dois milhões de anos-luz de nossa galáxia, o que significa dizer que a luz proveniente desta galáxia leva dois milhões de anos para chegar até nós. Isto, por sua vez, também significa dizer que quando vemos a nebulosa de Andrômeda lá no céu, na verdade estamos vendo o passado de Andrômeda, isto é, estamos vendo Andrômeda tal como ela era a há dois milhões de anos. Se um observador inteligente em algum ponto desta galáxia, um garotinho, por exemplo, apontar o seu telescópio para a Terra, ele não poderá nos ver. Na melhor das hipóteses ele verá alguns dos primeiros seres humanos, cujo cérebro era muito pouco desenvolvido.
- Chocante...
- As galáxias mais distantes de que temos notícia estão a cerca de dez bilhões de anos-luz da Terra. Quando recebemos sinais vindos dessas galáxias, na verdade nosso olhar retrocede para um momento no passado da história do universo, "distante" dez bilhões de anos de hoje. E isto é quase duas vezes a idade de nosso sistema solar.
- Estou tonta com tantos números.
- É verdade que pode ser difícil entender o que significa olhar para momentos tão remotos do passado; mas foi assim que os astrônomos descobriram uma coisa que é extremamente importante para nossa visão de mundo.
- Que coisa?
- Nenhuma galáxia do universo está parada. Todas as galáxias do universo estão em movimento e distanciam-se umas das outras a uma velocidade impressionante. E quanto mais distantes estão de nós, mais rapidamente parecem se mover. Isto significa que as distâncias entre as galáxias são cada vez maiores.
- Estou tentando imaginar como isso pode ser possível.
- Quando você pega uma bexiga e pinta uns pontinhos escuros nela, esses ponto vão se afastando uns dos outros à medida que você vai enchendo a bexiga de ar. O mesmo ocorre com as galáxias. Dizemos, nesse caso, que o universo se expande.
- Como se explica isso?
- A maioria dos astrônomos concorda em que a expansão do universo só pode ter uma explicação: em algum momento há cerca de quinze bilhões de anos, toda a matéria do universo estava concentrada num espaço reduzidíssimo. Ali, a densidade da matéria era extremamente elevada; e a gravidade e o calor também. Em dado momento, tudo explodiu. Esta explosão é chamada de a grande explosão, ou Big Bang, em inglês.
- Fico arrepiada só de pensar.
- O Big Bang espalhou espalhou matéria por todas as partes do universo e à medida que a matéria foi se esfriando, formou as estrelas, as galáxias, as luas, os planetas...
- Mas você não disse que o universo está em expansão?
- Sim, e justamente por causa da explosão há bilhões de anos. Isto porque o universo não possui uma topografia atemporal. O universo é um acontecimento, é uma explosão. As galáxias continuam se distanciando umas das outras a uma velocidade impressionante.
- E será assim pra sempre?
- É possível. Mas há também outras possibilidades. Você talvez ainda se lembre de quando Alberto contou a Sofia sobre as duas forças que mantém os planetas em suas órbitas ao redor do Sol.
- Não eram a força da gravidade e a inércia?
- Certo. E o mesmo ocorre com as galáxias, pois embora o universo continue em expansão, a gravidade continua a agir em sentido contrário. E um dia, daqui a alguns bilhões de anos, provavelmente, a gravidade talvez consiga puxar para um menino ponto todos os corpos celestes, à medida que as forças centrípetas da explosão forem se enfraquecendo. O que aconteceria, então, seria uma explosão ao contrário, ou o que chamamos de "implosão". Podemos comparar isto com o que acontece quando soltamos o ar que está dentro de uma bexiga. Só que este processo vai demorar tanto tempo que o processo desencadeado pela explosão.
- E no fim todas as galáxias serão novamente comprimidas num espaço minúsculo e denso?
- Sim, acho que você entendeu. E o que aconteceria depois?
- Provavelmente haveria uma nova explosão, depois da qual o universo voltaria a se expandir, pois as mesmas leis naturais continuariam a ter validade. Sim, e a consequência disso seria a formação de novas estrelas, de novas galáxias.
- Seu raciocínio está correto. No que se refere ao futuro do universo, portanto, os astrônomos vêem duas possibilidades: ou o universo continuaria a se expandir indefinidamente e as galáxias se afastariam cada vez mais umas das outras, ou o universo entraria num processo de contração. Tudo dependeria da quantidade de matéria presente no universo, coisa que os astrônomos ainda não sabem muito bem.
- Mas se o universo possui matéria suficiente para voltar a se contrair algum dia, isto significa que ele já se expandiu e se contraiu outras vezes, não?
- Isto seria uma conclusão óbvia. Mas também pode ser que esta seja a primeira vez que o universo se expande. E se ele continuar a se expandir indefinidamente, resta ainda a pergunta de como tudo começou.
- Sim, pois como surgiu aquilo que de repente explodiu?
- Nesse ponto, a visão cristã explica o Big Bang como o momento mesmo de toda a criação. De fato, na Bíblia está escrito que Deus disse: "Faça-se a luz!". Você se lembra quando Alberto falou da visão linear da história, característica do cristianismo. A noção que mais se adaptaria à fé cristã sobre a criação seria a de que o universo continuará a se expandir indefinidamente.
- Continue.
- No oriente, como você sabe, a história é vista como um processo cíclico. Isto significa que a história se repete por toda a eternidade. Na Índia, por exemplo, existe uma antiga crença segundo a qual o mundo está num processo continuo de expansão e contração. Assim, alternam-se o que os hindus chamam de "o dia de Brahma". Esta noção corresponde melhor, como parece óbvio, à noção de que o universo se expande e depois se contrai, para depois voltar a se expandir. E assim sucessivamente, num eterno processo cíclico. Podemos neste caso imaginar um grande coração cósmico, que bate e bate...
- Acho as duas teorias igualmente fascinantes e igualmente impossíveis de serem comprovadas.
- E ambas podem ser comparadas com o grande paradoxo da eternidade, sobre a qual Sofia pensou um dia quando estava em seu jardim: ou o universo sempre existiu, ou então um dia surgiu do nada...
- Ai!
Hilde colocou a mão na testa.
- O que foi?
- Acho que um mosquito me picou.
- Na certa foi Sócrates tentando despertar você para a vida...
Foi seu pai quem quebrou o silêncio:
- É um mistério pensar que vivemos num pequeno planeta em algum ponto do universo.
- Sim...
- A terra é um dos muitos planetas que orbitam ao redor do Sol. Mas nosso planeta é o único em que há vida.
- E talvez o único em todo o universo?
- Sim, é possível. De outro lado, também é possível que haja vida pulsando por todo o universo. Isto porque o universo é incomensuravelmente grande. As distâncias são tão grandes que as medimos em minuto e em anos-luz.
- O que vem a ser isto?
- Um minuto-luz é a distância que a luz percorre em um minuo. E isto é muito, pois no espaço sideral a luz percorre trezentos mil quilômetros em um segundo. Um minuto-luz é portanto, sessenta vezes trezentos mil, ou dezoito milhões de quilômetros. Um ano-luz são aproximadamente nove trilhões e meio de quilômetros.
- Qual é a distância até o Sol?
- Pouco mais de oito minutos-luz. Os raios do Sol, que nos aquecem o rosto num dia quente de junho, viajaram oito minutos no universo até chegarem a nós.
- Continue.
- Plutão, o planeta mais longínquo de nosso sistema solar, está a mais de cinco horas-luz da Terra. Quando um astrônomo observa Plutão com seu telescópio, na verdade ele volta cinco horas no seu tempo. Isto é o mesmo que dizer que a imagem de Plutão leva cinco horas para chegar até nós.
- Não é fácil imaginar como isso é possível, mas acho que entendo o que você está dizendo.
- Muito bem, Hilde. Aqui na Terra, nós estamos apenas começando a aprender a nos orientar. Nosso sol é uma das quatrocentos bilhões de outras estrelas que existem numa galáxia que chamamos de Via-Láctea. Esta galáxia se parece com um grande disco com muito braços espiralados e nosso sol fica num desses braços. Quando olhamos o céu estrelado numa noite clara de inverno, vamos um largo cinturão de estrelas, isto porque estamos olhando para o centro da Via-Láctea.
- Deve ser por isso que em sueco a Via-Láctea também é chamada de "jardim de inverno".
- A distância até nosso vizinho mais próximo na Via Láctea é de quatro anos-luz. Talvez seja aquela estrela que você esteja vendo brilhar sobre aquela pequena ilha lá em baixo. Imagine que há um observador naquela estrela com um telescópio de grande potência voltado para Bjerkely; nesse caso. ele estará vendo Bjerkely tal como era a quatro anos. E é possível que ele esteja vendo uma garotinha de onze anos sentada neste mesmo balanço com os pés sem tocar o chão.
- Inacreditável...
- E estamos falando apenas de nosso vizinho mais próximo. Toda a galáxia, ou "nebulosa", como também a chamamos, tem noventa mil anos-luz de largura. Isto significa que a luz leva todos esses anos para ir de uma ponta a outra da galáxia. Quando vemos uma estrela na Via-Láctea que está a cinquenta mil anos-luz de distância do Sol, estamos enxergando o passado, há cinquenta mil anos.
- Este pensamento é grande demais para uma cabeça pequena como a minha.
- Quando observamos o universo, na verdade estamos olhando o passado. E não nos resta outra saída. Nunca saberemos como o universo está agora. Quando olhamos para uma estrela lá no alto, a milhares de anos-luz da Terra, na verdade estamos viajando rumo a um passado que está a milhares de anos na história do universo.
- Isto é uma coisa absolutamente inimaginável.
- Mas tudo o que vemos chega aos nossos olhos como ondas luminosas. E essas ondas levam certo tempo para atravessar o espaço e chegar até nós. Podemos comparar isto com o trovão. Sempre ouvimos o trovão algum tempo depois de termos visto o relâmpago. E isto se explica porque as ondas sonoras são mais lentas do que as ondas luminosas. Quando ouço um trovão, na verdade estou ouvindo o ruído de algo que já aconteceu a pouco tempo atrás. O mesmo ocorre com as estrelas. Quando olho para um estrela lá no céu, que está a milhares de anos-luz da Terra, na verdade estou "vendo o trovão" de algo que aconteceu no passado, neste caso há milhares de anos.
- Entendo.
- Mas até agora só falamos de nossa própria galáxia. Os astrônomos acreditam que haja cerca de cem bilhões de galáxias no universo, e em cada uma dessas galáxias, por sua vez, existem centenas de bilhões de estrelas. A galáxia mais próxima da Via Láctea é a nebulosa de Andrômeda. A nebulosa de Andrômeda está a dois milhões de anos-luz de nossa galáxia, o que significa dizer que a luz proveniente desta galáxia leva dois milhões de anos para chegar até nós. Isto, por sua vez, também significa dizer que quando vemos a nebulosa de Andrômeda lá no céu, na verdade estamos vendo o passado de Andrômeda, isto é, estamos vendo Andrômeda tal como ela era a há dois milhões de anos. Se um observador inteligente em algum ponto desta galáxia, um garotinho, por exemplo, apontar o seu telescópio para a Terra, ele não poderá nos ver. Na melhor das hipóteses ele verá alguns dos primeiros seres humanos, cujo cérebro era muito pouco desenvolvido.
- Chocante...
- As galáxias mais distantes de que temos notícia estão a cerca de dez bilhões de anos-luz da Terra. Quando recebemos sinais vindos dessas galáxias, na verdade nosso olhar retrocede para um momento no passado da história do universo, "distante" dez bilhões de anos de hoje. E isto é quase duas vezes a idade de nosso sistema solar.
- Estou tonta com tantos números.
- É verdade que pode ser difícil entender o que significa olhar para momentos tão remotos do passado; mas foi assim que os astrônomos descobriram uma coisa que é extremamente importante para nossa visão de mundo.
- Que coisa?
- Nenhuma galáxia do universo está parada. Todas as galáxias do universo estão em movimento e distanciam-se umas das outras a uma velocidade impressionante. E quanto mais distantes estão de nós, mais rapidamente parecem se mover. Isto significa que as distâncias entre as galáxias são cada vez maiores.
- Estou tentando imaginar como isso pode ser possível.
- Quando você pega uma bexiga e pinta uns pontinhos escuros nela, esses ponto vão se afastando uns dos outros à medida que você vai enchendo a bexiga de ar. O mesmo ocorre com as galáxias. Dizemos, nesse caso, que o universo se expande.
- Como se explica isso?
- A maioria dos astrônomos concorda em que a expansão do universo só pode ter uma explicação: em algum momento há cerca de quinze bilhões de anos, toda a matéria do universo estava concentrada num espaço reduzidíssimo. Ali, a densidade da matéria era extremamente elevada; e a gravidade e o calor também. Em dado momento, tudo explodiu. Esta explosão é chamada de a grande explosão, ou Big Bang, em inglês.
- Fico arrepiada só de pensar.
- O Big Bang espalhou espalhou matéria por todas as partes do universo e à medida que a matéria foi se esfriando, formou as estrelas, as galáxias, as luas, os planetas...
- Mas você não disse que o universo está em expansão?
- Sim, e justamente por causa da explosão há bilhões de anos. Isto porque o universo não possui uma topografia atemporal. O universo é um acontecimento, é uma explosão. As galáxias continuam se distanciando umas das outras a uma velocidade impressionante.
- E será assim pra sempre?
- É possível. Mas há também outras possibilidades. Você talvez ainda se lembre de quando Alberto contou a Sofia sobre as duas forças que mantém os planetas em suas órbitas ao redor do Sol.
- Não eram a força da gravidade e a inércia?
- Certo. E o mesmo ocorre com as galáxias, pois embora o universo continue em expansão, a gravidade continua a agir em sentido contrário. E um dia, daqui a alguns bilhões de anos, provavelmente, a gravidade talvez consiga puxar para um menino ponto todos os corpos celestes, à medida que as forças centrípetas da explosão forem se enfraquecendo. O que aconteceria, então, seria uma explosão ao contrário, ou o que chamamos de "implosão". Podemos comparar isto com o que acontece quando soltamos o ar que está dentro de uma bexiga. Só que este processo vai demorar tanto tempo que o processo desencadeado pela explosão.
- E no fim todas as galáxias serão novamente comprimidas num espaço minúsculo e denso?
- Sim, acho que você entendeu. E o que aconteceria depois?
- Provavelmente haveria uma nova explosão, depois da qual o universo voltaria a se expandir, pois as mesmas leis naturais continuariam a ter validade. Sim, e a consequência disso seria a formação de novas estrelas, de novas galáxias.
- Seu raciocínio está correto. No que se refere ao futuro do universo, portanto, os astrônomos vêem duas possibilidades: ou o universo continuaria a se expandir indefinidamente e as galáxias se afastariam cada vez mais umas das outras, ou o universo entraria num processo de contração. Tudo dependeria da quantidade de matéria presente no universo, coisa que os astrônomos ainda não sabem muito bem.
- Mas se o universo possui matéria suficiente para voltar a se contrair algum dia, isto significa que ele já se expandiu e se contraiu outras vezes, não?
- Isto seria uma conclusão óbvia. Mas também pode ser que esta seja a primeira vez que o universo se expande. E se ele continuar a se expandir indefinidamente, resta ainda a pergunta de como tudo começou.
- Sim, pois como surgiu aquilo que de repente explodiu?
- Nesse ponto, a visão cristã explica o Big Bang como o momento mesmo de toda a criação. De fato, na Bíblia está escrito que Deus disse: "Faça-se a luz!". Você se lembra quando Alberto falou da visão linear da história, característica do cristianismo. A noção que mais se adaptaria à fé cristã sobre a criação seria a de que o universo continuará a se expandir indefinidamente.
- Continue.
- No oriente, como você sabe, a história é vista como um processo cíclico. Isto significa que a história se repete por toda a eternidade. Na Índia, por exemplo, existe uma antiga crença segundo a qual o mundo está num processo continuo de expansão e contração. Assim, alternam-se o que os hindus chamam de "o dia de Brahma". Esta noção corresponde melhor, como parece óbvio, à noção de que o universo se expande e depois se contrai, para depois voltar a se expandir. E assim sucessivamente, num eterno processo cíclico. Podemos neste caso imaginar um grande coração cósmico, que bate e bate...
- Acho as duas teorias igualmente fascinantes e igualmente impossíveis de serem comprovadas.
- E ambas podem ser comparadas com o grande paradoxo da eternidade, sobre a qual Sofia pensou um dia quando estava em seu jardim: ou o universo sempre existiu, ou então um dia surgiu do nada...
- Ai!
Hilde colocou a mão na testa.
- O que foi?
- Acho que um mosquito me picou.
- Na certa foi Sócrates tentando despertar você para a vida...
O major colocou o braço no ombro
de Hilde.
- Você está ouvindo como é bonito
o som da água batendo nas pedras?
- Sim.
- Amanha vamos colocar o barco na
água.
- Mas você está ouvindo como é
estranho o sussurro do vento? Você está vendo como tremulam as folhas dos
álamos?
- Este é um planeta vivo, Hilde.
- Numa passagem você escreveu
sobre o que às vezes está “nas entrelinhas” desse jardim.
- De qualquer forma, a natureza é
cheia de mistérios. E agora estamos falando das estrelas no céu.
- Logo haverá também estrelas na água.
- Certo. Era assim que você
chamava as fosforescências do mar quando era pequena. E de alguma forma você
estava certa. As fosforescências do mar e todos os outros organismos compõem-se dos mesmos elementos que foram
fundido um dia para formar uma estrela.
- Nós também?
- Sim, nós também somos poeira
estelar.
- Bonito isso que você disse.
- Quando os radiotelescópios
captam sinais de galáxias que estão a bilhões de anos-luz de distância, eles
nos mostram um pouco do que o universo foi em tempos primordiais. Isto
significa que “vemos” as galáxias mais distantes tal como elas eram pouco
depois do Bing Bang. Tudo o que o homem vê no céu são,na verdade, fósseis
cósmicos de milhares e milhões de anos atrás. A única coisa que um astrólogo
pode prever, portanto, é o passado.
- Isto porque as estrelas de uma constelação
já se afastaram umas das outras muito antes da sua luz chegar até nós, certo?
- Certo. Há dois mil anos as
constelações eram muito diferentes do que são hoje.
- Eu não sabia.
- Em noites claras, podemos
enxergar o passado da história do universo tal como ele foi um dia há milhões,
bilhões de anos. E ao fazer isso, de certa forma estamos olhando para trás rumo
à nossa origem.
- Explique melhor.
- Você e eu também começamos com
o Big Bang, pois toda a matéria do universo é uma unidade orgânica. Em algum
momento, num passado remotíssimo, toda a matéria se concentrou num bloco tão
assustadoramente maciço, que o pedacinho do tamanho da cabeça de um alfinete
pesava alguns bilhões de toneladas. Esta matéria primordial explodiu devido à
sua gravidade elevadíssima. E aquele bloco condensado inicial se desfez em
pedaços. Só que toda vez em que olhamos para o céu, tentamos encontrar um
caminho que nos leve de volta à origem.
- Que bela forma de se exprimir.
- Todas as estrelas e galáxias no
universo compõem-se da mesma matéria. Um pouco dessa matéria se uniu aqui e
agora. Uma galáxia pode estar a bilhões de anos-luz das outras, mas todas têm a
mesma origem. Todas as estrelas e todos os cometas são de uma mesma estirpe...
- Entendo.
- O que é esta matéria que compõe
o mundo? O que foi que explodiu há bilhões de anos? De onde ela veio?
- Este é o enigma maior.
- Mas ele diz respeito a todos
nós. Profundamente. Nós também somos feitos dessa matéria. Somos uma centelha
da grande fogueira acesa há bilhões de anos.
- Também foi bonito isto que você
disse.
- Mas não vamos exagerar na
importância de todos esses números. Basta termos uma pedrinha nas mãos. O
universo seria igualmente incompreensível, se não passasse de uma pedra do
tamanho de um limão. A pergunta, nesse caso, seria igualmente insondável: de
onde veio esta pedrinha?
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