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quarta-feira, 25 de junho de 2014

festa estranha com gente esquisita

A) você é esquisita.
- B) Tenho sido mesmo.
- A) Já ta cansada de ouvir né?!
- B) Falar me cansa mais.
- A) Ta certo.
- A) É...
(Breve silêncio constrangedor)
- A)Na verdade, depende né?!
- B) Verdade?
- A) Que? Tô falando que depende...
- B) que verdade?
- A) Não você não entendeu o que eu queria dizer...
- B) Ah tá.
- A) O que?
- B) Não entendi mesmo. Tem razão.
(Longo silencio)
- A) É serio isso?
- B) O que?
- A) Você não vai me perguntar sobre o que eu pensei?
- B) Imagina... Seria muito invasivo... Direito seu.
- A) Tudo bem.
(Breve silêncio)
-A) As vezes o esforço pra não se comunicar cansa mais.
- B) As vezes sim.
- A) Mas tem gente que sente prazer.
- B) É deve ter. Sempre tem né?!
- A) Cada um com o seu cada qual. Falava uma tia minha.
- B) Alguma minha devia falar também.
- A) Sua o que?
-B) Tia. Frase de tia. Tipo a do macaco e do galho é mais comum as avós e do maluco com as manias se adequa mais a professores... Pode ser coisa minha também. Opinião né?!
- A) É que nem bunda. Cada um...
- B) Ou essa aí! É ótima.
- A) Essa é mais de amigo de ginásio em escola de interior. Que que você acha?
- B) Pode ser. boa. Acho que eu vou.
- A) Pra onde? Quer carona?
- B) Não sei ainda... Senão eu aceitava. Desculpa.
- A) De nada.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

"Mistérios Insondáveis" de Alcione Araújo

O poder da razão nos enche de genuíno orgulho. É extraordinária a capacidade humana para compreender o mundo em que vivemos - da minúscula intimidade da matéria aos espaços infinitos do cosmo, da inteligência artificial ao uso das células-tronco. É tamanha a empolgação com a capacidade de compreender as miraculosas elaborações da razão que, às vezes, somos instilados a crer que não há limites para o conhecimento - o que, de fato, parece não existir - e nós alçamos a extremos nos quais a soberba ultrapassa a própria razão. 

Inflados pela onipotência, passamos a viver como senhores da natureza e deuses da razão. Nesses momentos, humildade deixa de ser apenas uma virtude e passa a ser uma necessidade - até para ajustar pesos e contrapesos e restaurar o equilíbrio. 

A despeito das fantásticas conquistas da ciência, a espécia humana convive com mistérios tão insondáveis quanto essenciais à vida. É quase alarmante que a vida siga seu curso sem que possamos balbuciar qualquer verdade sobre questões que nos acompanham do nascimento à morte.

O nascimento, para começar é um mistério. Nada sabemos como e quando a vida se instala. Além do absurdo acaso implícito num determinado espermatozoide, entre milhões, fecundar o ovo e resultar num ser e não noutro, inteiramente distinto - o que nos define como um acaso da natureza, ao qual se junta o aleatório da programação celular detectado pela biologia genética. Somos, enfim, um acaso do acaso. Ademais, quase todo o saber clínico sobre o nascimento apoia-se em estatísticas e estudos de caso - não no conhecimento do momento decisivo onde tudo começa. Vivemos no mistério do nosso surgimento.

Noutro extremo, a morte - sabemos o que leva ao colapso de órgãos e sistemas, mas nada sabemos sobre o que ocorre após o repouso cerebral - instala-se nos inescrutável domínio da fé. No âmbito do conhecimento, é puro mistério. Sabemos que a vida, tudo o que somos e deixamos de ser, se dá entre o nascimento e a morte, nossos limites. E nada sabemos sobre os próprios extremos determinantes da vida entre si.

Mencionei a seara inescrutável da fé - eis outro mistério. Sabemos que muitas pessoas têm fé - vários tipos, em vários revelações -, mas não sabemos dizer o que seria a fé. Santo Agostinho, que a chamava de esperança, considerava-a um privilégio - ou seja, não é para todos! E reiterava essa ideia como quase um paradoxo. Dizia o santo das Confissões que quem entendeu Deus está longe da verdade, porque Deus não é acessível pela razão. Que mistério a fé! Sem ironia, para ter fé é preciso crer, antes, na fé - que não se dispõe ao entendimento. 

Mais prosaico e rotineiro, porém não menos misterioso e intrigante, é o sonho. Desde as remotas civilizações nos primórdios da espécie que o homem quer entender os sonhos. O Talmude, o Corão e a Bíblia estão repletos de interpretações dos sonhos. No início do século XX, Freud, com A interpretação dos sonhos, lançou alicerces da teoria da subjetividade. Mas é uma interpretação entre outras. Dormimos todas as noites com o desconhecido sonho.

E o que sabemos do amor? Como surge, de que se constitui? Sabemos que são complexos impulsos subjetivos, vindos de recônditos obscuros, mas não conseguimos defini-lo. Pode-se se escolher, com critérios da razão, um marido, uma esposa, pode-se criar parcerias e conveniência e pode-se acomodar afinidades, mas não pode escolher a quem se ama. O amor brota por si e como um mistério.

Há outros, muitos outros, mistérios que nos cercam. Lembro só mais um, com o qual convivo dia e noite: a arte. Para o que é a arte, de que se constitui e a que serve, não há respostas conclusivas, todas giram em torno de conceitos - talvez pela falta de uma teoria geral da emoção, outro mistério! Por lidar com a criação, a arte propõe paradoxos, que não respondem, mas nos distraem do seu próprio mistério, como o de Jean Cocteau: "A arte é indispensável, se ao menos soubéssemos para quê."

(Crônica escrita por Alcione Araújo para o jornal Estado de Minas, retirada do livro "Cala a boca e me beija")