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quinta-feira, 29 de maio de 2014

História da Astronomia 1

(Síntese feita a partir dos livros "Uma Breve História do Tempo, do Bing Bang aos Buracos Negros", "O Universo numa Casca de Noz" de Stephen W. Hawking, "Astronomia" de Jan Ridpath e “Poeira das Estrelas” de Marcelo Gleiser)

A astronomia é chamada a mais antiga das ciências. Desde a aurora da civilização o homem luta para entender os complexos movimentos dos corpos celestes, e incontáveis monumentos e artifícios refletem essa fascinação.
A gruta de Lascaux, na região dos Pirineus, França, guarda em suas paredes desenhos feitos há 17 mil anos, de animais que, segundo interpretações recentes, representam as constelações visíveis no céu naquele momento. A gruta só é iluminada num único dia do ano, o solstício de inverno, e foi descoberta por acaso em setembro de 1940, por quatro adolescentes que exploravam a região.
Stonehenge, sítio arqueológico localizado em Amesbury, interior da Inglaterra, é um dos primeiros instrumentos astronômicos que se tem notícia, servindo para marcar o movimento do Sol ao longo do ano. Os celtas que viviam na região há cerca de 3.500 anos, construíram o monumento usando pedras de até 40 toneladas cada uma, trazidas de uma pedreira situada a 30 quilômetros de distância. Como conseguiram até hoje não se sabe exatamente.
Os egípcios adoravam o Sol como a um deus. As pirâmides do Egito, erguidas por volta de 2.500 a.C, corporificam alinhamentos astronomicamente significativos baseados no conhecimento do céu (como é o caso de Quéops alinhada com a estrela polar).

TRADIÇÃO BABILÔNIA:
O verdadeiro berço da astronomia foi o Oriente Médio. Várias civilizações antigas estudaram o céu e seus ciclos, mas os babilônios alcançaram sofisticação (ajudados pelos sumérios que os precederam na Mesopostâmia).  Duas pequenas tábuas de argila cozida produzidas por volta de 1.500 a.C pelos habitantes do Iraque atual resumem informações sobre os movimentos das estrelas e dos planetas. A tábua de Amizaduga detalha o movimento do planeta Vênus durante 21 anos, prognosticando sucesso e desastre em guerras, variações climáticas, períodos de fome assim como nascimento de reis, príncipes e nações. A lista de estrelas e constelações que conheciam atesta uma antiga tradição de observação celeste. Algumas constelações como Leão e Escorpião chegaram até nós quase inalteradas. Os babilônios deram outra grande contribuição à astronomia: mediram a duração do ano em 360 dias, dividiram o círculo do céu em 360 graus, subdividiram cada grau em 60 partes e introduziram o dia de 24 horas, cada hora dividida em 60 partes.

Para os babilônios os céus eram divinos. Conhecer seus movimentos significava conhecer as intenções dos deuses. Assim originou-se a astrologia babilônica, que tentava relacionar o movimento e as posições dos objetos celestes com premonições e agouros.

(Na metade do século 19 foi descoberta no palácio de Ninawa, no Iraque, uma pequena tábua de pedra cuneiforme, que após uma análise mais detalhada na época foi concluído que tratava-se de um planisfério, ou seja, um objeto com anotações feitas a milhares de anos por um astrônomo sobre o posicionamento de alguns corpos celestes.)

A VISÃO GREGA:
O conhecimento da astronomia babilônia chegou à Grécia cerca de 600 a.C. Os babilônios interessavam-se sobretudo por adivinhar augúrios celestes - o que chamaríamos de astrologia -, mas o gregos procuravam compreender os princípios físicos segundo os quais o universo funcionava, começando a separar a ciência da superstição. Influenciados pelo conhecimento matemático e astronômico dos babilônios e dos egípcios, os gregos começaram a refletir sobre a natureza, a origem do mundo e os fenômenos naturais usando a razão, e não a religião, como ferramenta de descoberta. Nasceu assim a filosofia natural, o método que utiliza argumentos racionais para descrever fenômenos da natureza.
Tudo indica que o primeiro filósofo foi Tales, que viveu por volta de 600 a.C, na cidade de Mileto, hoje parte da costa oeste da Turquia. Figura lendária, pouco sabemos dele. Infelizmente, como ocorreu com a maioria dos chamados filósofos pré-socráticos, nada restou dos seus escritos. Tales teria previsto um eclipse solar que interrompeu uma guerra: verdade ou não, a história mostra que ele tinha fama de conhecer bem astronomia. A importância filosófica de Tales é atribuída ao fato de ter sido ele o primeiro a se questionar sobre a natureza material das coisas. Mais precisamente, foi o primeiro a perguntar do que tudo é feito, qual a composição da matéria. Essa é uma pergunta essencialmente científica, já que procura encontrar uma explicação material para o mundo.
Por volta de 570 a.C nasceu outro grande pioneiro da filosofia, Pitágoras. Para Pitágoras a matemática representava a linguagem da natureza, a ponte entre a razão humana e os segredos do mundo natural. A função do filósofo era estudar as relações entre os números e as formas, desvendando a estrutura racional do cosmo.
Demócrito (400 a.C) juntamente com Leucipo, é considerado o criador da doutrina atomista. Segundo os atomistas, tudo no cosmo é feito de pequenas partículas indivisíveis chamadas átomos – o que não pode ser cortado. Esses átomos, infinitos em número, podiam combinar-se para dar origem às várias formas e aos vários fenômenos que observamos no mundo natural. Mesmo que os átomos da ciência moderna sejam bem diferentes daqueles dos atomistas (podem ser divididos e não são infinitos em número), a idéia de que a matéria é composta de pequenos tijolos fundamentais permanece viva até hoje.
Sócrates, por sua vez, rebelou-se contra o pensamento materialista de alguns de seus antecessores, preocupando-se mais com questões morais e legais, a filosofia dos homens e sua organização social. Porém um de seus discípulos, Platão, voltou a refletir sobre questões metafísicas, incluindo a natureza da realidade. Segundo ele, a realidade podia ser dividida em duas partes: a das idéias, a realidade mental e a dos sentidos, a realidade sensorial. Platão era um grande admirador da razão humana e da nossa capacidade de descrever a realidade em termos matemáticos. Acreditava que o cosmo era produto de uma divindade inteligente que chamou de Demiurgo, um profundo conhecedor da geometria. Já a realidade sensorial era suspeita, traiçoeira. Platão postulou que o cosmo, sendo produto de uma mente superior, devia refletir em sua estrutura as proporções ideais da geometria. Portanto, como já haviam postulado os pitagóricos, a Terra, a Lua, e Sol eram esféricos, dado que a esfera é a forma mais perfeita. Pela mesma razão, as órbitas celestes só podiam ser circulares.
 Eudóxio, um astrônomo grego do século IV a.C, desenvolveu um sistema de 27 esferas cristalinas, aninhadas umas dentro das outras girando em torno de diferentes eixos e velocidades, que deslocavam os corpos celestes ao redor de uma Terra esférica.
As idéias de Platão sobre a forma dos astros e suas órbitas foram herdadas por seu discípulo Aristóteles. Aristóteles acreditava que a Terra era estática e que o Sol, a Lua, os planetas e as estrelas giravam em órbitas circulares à sua volta. Acreditava nisso por razões místicas que a Terra fosse o centro do universo e a órbita circulara mais perfeita. Como a maioria dos filósofos gregos, Aristóteles não concordava com a idéia de criação porque ela contém muitos indícios da intervenção divina. Acreditava que o mundo e a raça humana sempre tenham existido. Afirmava que os dilúvios periódicos, e outros desastres devolviam os humanos aos princípios da civilização. Em seu livro "Sobre o Firmamento" (340 a.C) evidenciou três bons argumentos para sustentar a crença de que a Terra era uma esfera e não um corpo achatado:
- Os eclipses da lua (Causados pelo posicionamento da Terra ao se colocar entre o Sol e a Lua) - A sombra projetada na Lua era sempre redonda. Se a Terra fosse um disco sua sombra seria alongada e elíptica, a menos que o eclipse sempre ocorresse quando o sol estivesse diretamente sobre o centro do disco.
- A estrela polar - Os gregos sabiam por suas experiências em viagens, que a estrela polar parecia mais baixa no céu quando vista do sul do que se observada de regiões mais ao norte. Uma vez que a estrela fica sobre o pólo norte, um observador que aí se encontre, perceberá a estrela sobre si, mas alguém no equador a observa exatamente na linha do equador. Da diferença na posição aparente da estrela polar no Egito e na Grecia, Aristóteles fez uma estimativa que a distancia em volta da Terra era de 400mil estádias (Não se conhece a medida exata de uma estádia, mas deve ser próxima de 180m, o que tornaria a estimativa duas vezes maior que a atual aceita).
- As velas dos navios - Observou que primeiro as velas de um navio aparece no horizonte e só depois o casco.
Hiparco compilou o primeiro catálogo preciso das estrelas visíveis a olho nu, no século II a.C. Além de medir suas posições ele classificou a estrelas em seis categorias de brilho, criando a escala de magnitude usada hoje.
No século II d.C, Ptolomeu sintetizou o conhecimento astronômico grego na obra Almagesto (que significa: o maior), contendo uma versão atualizada do catálogo de estrelas de Hiparco usado até hoje, e formulou um modelo cosmológico completo adotado pela religião e pela filosofia que dominou durante toda a Idade Média. A Terra ficaria no centro, circundada por oito esferas: a Lua, o Sol, as estrelas, Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno. A esfera mais afastada seria das estrelas, que manteriam sempre a mesma posição relativa entre si, girando juntas através do céu. O que havia além da última esfera jamais ficou esclarecido.

O modelo de Ptolomeu estabelecia um sistema razoavelmente preciso, porém teve que pressupor que a Lua seguia uma trajetória tal que em algumas épocas a levava duas vezes mais próxima da Terra que em outras. Ptolomeu reconheceu essa falha. Apesar da falha o sistema foi aceito no geral, adotado pela Igreja Católica  como a imagem do universo que correspondia às escrituras, porque garantia espaço fora da esfera das estrelas, para o céu e o inferno.

(Figura: Andreas Cellarius, Harmonia Macrocosmica, Amsterdam, 1660. O modelo geocêntrico de Ptolomeu.)



















ASTRONOMIA NO EXTREMO ORIENTE:
Os chineses reconheciam 283 constelações, muitas pequenas e sem brilho. Os gregos viam no céu animais e heróis mitológicos, e as constelações chinesas representavam cenas da corte e da vida social. Os astrônomos do Extremo Oriente valorizavam fenômenos inesperados chamados "estrelas visitantes", que hoje conhecemos como cometas, novas e supernovas. Entre os eventos descritos estava a explosão de uma supernova que deu origem à nebulosa de Caranguejo em 1054 d.C.

CONSTELAÇÕES ÁRABES:
Com o declínio da civilização greco-romana, e a ascensão da Igreja Católica a partir do século III, o foco intelectual havia mudado. Santo Agostinho, o grande teólogo cristão que viveu por volta de 400 d.C, proclamou profano qualquer interesse nos afazeres da natureza “Acima da tentação carnal (...) existe também a tentação da mente (...) em busca de conhecimento e sabedoria”. A salvação eterna só seria alcançada através da completa devoção a Deus e à religião. A curiosidade sobre o mundo foi reprimida e, na Europa Medieval, praticamente esquecida. Quando os árabes invadiram a Europa, levaram com eles os textos dos grandes filósofos gregos. O centro da investigação astronômica transferiu-se para Bagdá, onde foram traduzidos para o árabe escritos de Ptolomeu, Platão, Arquimedes, Pitagorás....  Entre os séculos X e XIII os obras gregas antigas foram reintroduzidas na Europa.

Pouco antes de 1000 d.C, o astrônomo árabe Al-Sufi produziu uma versão revista do catálogo de estrelas de Ptolomeu com o desenho de todas as constelações: O livro das estrelas fixas


(O livro das estrelas fixas)

O RENASCIMENTO DA ASTRONOMIA OCIDENTAL:
            Com a expansão das cidades, o poder e a afluência da aristocracia aumentam. Pintores, escultores, músicos e astrólogos são convidados a integrar várias cortes, dividindo com seus patronos suas criações artísticas e especulações filosóficas. Os livros, antes copiados manualmente, passam a ser impressos por máquinas, o que acelera sua produção e diminui seu preço. No século XV, começam as explorações marítimas em busca de novas rotas de acesso à Ásia, o “caminho das Índias”. O mundo cresce, os europeus são expostos a “novas” (na verdade muito mais antigas) culturas, algumas julgadas primitivas, como a costa leste das Américas, e outras sofisticadas, como a China e a Índia. É também no século XV que a Igreja começa a perder sua hegemonia. Na Alemanha, Martinho Lutero (1483-1546) propõe uma fé alternativa, protestando contra a concentração de poder e a comercialização do cristianismo pregado pelo Vaticano. É nesse clima de questionamento religioso, de renascimento das artes e do espírito de exploração que cresce Nicolau Copérnico, o polonês que irá pôr o Sol no centro do cosmo.
Nicolau Copérnico (um padre e astrônomo polonês) propôs no séc.XVI um modelo mais simples em que o Sol fosse o centro estático, em torno do qual a Terra e outros planetas se deslocavam em órbitas circulares. Copérnico reviveu a teoria heliocêntrica proposta pelo filósofo grego Aristarco de Samos (310-230 a. C.). Lutero zombou das idéias de Copérnico, afirmando que um certo astrônomo queria virar a astronomia do avesso, fazendo a Terra girar em torno do Sol como se fosse um carrossel. Copérnico divulgou anonimamente por medo de ser considerado herege. Copérnico também temia a critica de outros astrônomos, embora seu livro Sobre as revoluções das esferas celestes (venderam-se tão poucos exemplares que a obra foi apelidada de "o livro que ninguém leu") tenha sido publicado em 1543, suas idéias já estavam formadas 1510. A história de Copérnico termina de forma trágica. Adoentado, entrega o manuscrito de sua grande obra a Rethicus, seu único discípulo. O jovem é incumbido de levar o manuscrito a Nuremberg. Dedido a problemas pessoais (alguns historiadores afirmam que Rethicus era homossexual e teve que fugir às pressas), a obra acaba nas mãos de Andreas Osiander, um teólogo luterano contra as idéias de Copérnico. Osiander adiciona ao livro um prefácio no qual afirma que as idéias ali encontradas são mera ficção, apenas um modelo matemático, útil para calcular a posição dos planetas, embora não correspondesse à realidade. O detalhe perverso é que Osiander assina o prefácio em nome de Copérnico, como se o próprio astrônomo considerasse o cosmo heliocêntrico uma abstração. Quase um século se passou para a hipótese ser considerada com seriedade.
Curiosidade: Muito antes de Copérnico, outros pensadores já haviam proposto modelos heliocêntricos do cosmo. Os primeiros registros constam de manuscritos religiosos da antiga Índia, no século VII a.C. Mas foi Ariabata, astrônomo e matemático hindu que viveu entre os anos 476 e 550 d.C, quem apresentou o modelo mais elaborado: além de propor que a Terra girava em torno do Sol, disse ainda que a Terra girava em torno do próprio eixo e que a luz da Lua era, na verdade, a luz do Sol refletida.
Johanner Kepler foi o primeiro a desmascarar abertamente a trapaça literária de Osiander. Sabia que o astrônomo polonês jamais teria escrito aquilo. Afinal, Copérnico havia dedicado seu livro ao papa Paulo III, enfatizando sua opinião de que a bíblia não deveria ser usada para descrever fenômenos celestes. Em 1593, teve aulas com o professor de astronomia Michael Maestlin, um copernicano às escondidas que ensinava a alguns alunos as idéias heliocêntricas do mestre polonês, enquanto publicamente passava por aristotélico. Kepler foi profundamente influenciado pelas idéias copernicianas de seu mestre.  Para ele o Sol, e apenas ele, poderia ser o centro do cosmo por motivos essencialmente religiosos. Do Sol vem a luz que ilumina o cosmo, que dissipa as trevas da noite; do Sol vem o calor que torna a vida possível. Kepler propõe uma analogia entre a Santíssima Trindade e o cosmo: o pai é o Sol, no centro; o filho, a esfera das estrelas fixas, nos confins do universo; e o espírito santo é a luz, a energia que flui do pai ao filho. Em 1596 com 25 anos, publicou seu primeiro livro O mistério cosmográfico, onde defende que o Sol não só era o centro do cosmo como também causava o movimento dos planetas à sua volta. Kepler propôs uma interação entre o Sol e os planetas, uma espécie de ressonância entre suas “almas”. No livro Kepler vai além. Não se contentando em investigar a causa dos movimento planetários, propõe também uma explicação para a distância entre cada uma dele e o Sol. Vê-se no título do livro, uma preocupação com a “cosmografia”, uma preocupação com o arranjo espacial do universo. Influenciado pelos pitagóricos, ele acreditava que a geometria, e só ela, era capaz de explicar o arranjo do cosmos. Deus era a inteligência suprema, e a geometria, a língua a língua com que Ele se comunicava com a mente humana. Portanto cabia aos homens desvendar os mistérios da natureza usando a geometria.  A ciência para Kepler, era um veículo de idolatria. Para explicar as distâncias, usou os cinco sólidos platônicos, as cinco figuras mais regulares da geometria tridimensional, e criou um arranjo em que cada planeta girava em uma esfera.
Kepler veio de uma família humilde e profundamente problemática. A mãe, acusada de bruxaria, quase acabou seus dias queimada na fogueira. O pai, um mercenário de reputação duvidosa acabou abandonando a família após anos de abusos. Na vida adulta as coisas não melhoraram. No início do século XVII, e Europa estava dividida pelas disputas religiosas  entre católicos e protestantes. Kepler foi vítima desses conflitos: era um luterano que servia as cortes católicas, vivia sob constante perseguição. Kepler que na época trabalhava em Graz, na Austrália, foi exilado pelos líderes católicos, que decretaram a conversão ou expulsão de todos os líderes da cidade. Sem ter para onde ir, em 1600 foi convidado ao castelo do nobre dinamarquês Tycho Brahe (o maior astrônomo da época, matemático imperial da corte de Rodolfo II), nos arredores de Praga.
Tycho era o oposto de Kepler, cresceu como um príncipe e viveu como tal. Contrariou a família, recusando-se a seguir a carreira diplomática, encantado desde cedo com a astronomia. Com muito dinheiro e muita paixão, construiu os maiores e maios precisos instrumentos astronômicos que o mundo jamais vira, sextantes e quadrantes, pesando toneladas. Logo obteve resultados que lhe conquistaram fama por toda a Europa. Em 1572, mostrou que uma “nova estrela”, que surgiu na constelação de Cassiopéia e brilhou nos céus durante meses, estava bem mais longe que a Lua. Em 1577, seguiu o movimento de um cometa concluindo que se encontrava muito distante. O rei da Dinamarca ficou tão impressionado com as descobertas de Tycho que lhe deu uma ilha inteira para transformá-la num observatório astronômico. A personalidade tirânica de Tycho, porém, causou-lhe problemas. Cristiano IV, o sucessor do reino da Dinamarca, cortou-lhe o salário e tirou-lhe os direitos sobre a ilha. Tycho viu-se forçado a procurar outro patrono. Foi então que se uniu a Rodolfo II em Praga. Em 1600, mudou-se para o Castelo de Benatky onde Kepler foi ao seu encontro.
A relação entre Kepler e Tycho não poderia ter sido mais tempestuosa. Kepler precisava dos dados de Tycho, estava convencido de que com eles, demonstraria de uma vez por todas que seu arranjo cósmico estava correto. Tycho por sua vez contava com o talento matemático de Kepler para comprovar seu modelo cósmico. Por motivos religiosos, Tycho não gostava da idéia de ter o Sol como centro. Conservador na leitura da Bíblia, não encontrou menção que a Terra se movia. Propôs um modelo segundo o qual a Terra permaneceria no centro, o Sol girava à sua volta, e todos os planetas giravam em torno do Sol.
Kepler não escondeu suas intenções e seu entusiasmo pelas idéias de Copérnico, e Tycho furioso , recusou-se a fornecer-lhe dados, resultado de décadas de estudo. Como concessão, cedeu-lhe apenas observações relativas ao planeta Marte. Depois de nove anos Kepler publicou um livro sobre sua órbita criando uma nova astronomia. No livro Astronomia nova Kepler chega a duas conclusões revolucionárias: primeiro que as órbitas planetárias não eram círculos, mas elipses (o círculo deixava de ser a figura geométrica mais importante da astronomia); em segundo lugar demonstrou que sua conjectura sobre a interação entre o Sol e os planetas estava correta. Em vez de “alma”, sugeriu que forças magnéticas causavam as órbitas planetárias. Influenciado pelas idéias do inglês William Gilbert, que havia demonstrado que a Terra era um gigantesco imã. Kepler abriu as portas para um novo cosmo, onde os movimentos celestes obedecem a leis matemáticas precisas e nada ocorre sem uma causa física.
Curiosidade: No dia 17 de outubro de 1604, Kepler observou que uma estrela  extremamente brilhante havia aparecido na constelação de Ofiúco, na Via Láctea. Kepler descreveu a observação em detalhes na obra De Stella Nova in Pede Serpentarii. Ele não sabia, mas era uma supernova, explosão resultante do colapso de uma estrela maciça. Mais tarde, em sua homenagem, a estrela recebeu o nome de “supernova de Kepler”. Essa foi a última explosão de supernova observada até hoje na Via Láctea.

GALILEU GALILEI (1564-1642):
            Ao mesmo tempo em que era criada uma nova astronomia na Europa Central, na Itália, outro revolucionário contestava o saber aristotélico, proclamando que não só no céu, mas também na Terra, uma nova física era necessária. Na mesma época em que Kepler fugia de perseguições religiosas de uma cidade a outra, a Igreja Católica enfrentava agressivamente o desafio crescente dos protestantes com a Contra-Reforma, que visava fortalecer novamente as bases. A ordem dos Jesuítas foi criada em 1540, com o intuito de espalhar os ensinamentos da fé católica, mesmo que a custa de conversões forçadas de judeus, muçulmanos e das populações nativas das colônias. A Sagrada Inquisição zelava pelos interesses da Igreja. Exceções eram inaceitáveis: aqueles que se opunham à Igreja sofriam conseqüências terríveis. Em 1600, o monge beneditino e filósofo Giordano Bruno foi queimado em praça pública no coração de Roma. Seu crime foi ter propagado os ensinamentos de Copérnico, proclamando não só que o Sol ser o centro do cosmo, como também que existiam infinitos outros sóis e planetas espalhados pelo espaço. Bruno recusou-se a abjurar suas idéias e pagou com a vida.
Os experimentos do jovem de vinte poucos anos, Galileu Galilei,  na década de 80 do século XVI realizados na Itália, ajudaram a fundar a física moderna. Ele deixou cair objetos de diferentes pesos de uma torre alta e descobriu que todos chegavam no solo ao mesmo tempo contrariando cientistas aristotélicos. Descobriu ainda que a velocidade de um objeto em queda dobrava a cada 9,8m que caia - número constante mais tarde conhecido como aceleração pela gravidade. 
O famoso conflito com a Igreja Católica se demonstrou fundamental para sua filosofia; é dele a argumentação pioneira de que o homem pode ter expectativas de compreensão do funcionamento do universo e que pode atingi-la através da observação do mundo real.
Galileu foi o grande pioneiro do que chamamos de “método científico”: hipóteses e teorias sobre fenômenos naturais tem que ser comprovadas através de experimentos ou, quando isso é impossível – como, por exemplo, da astronomia ou da paleontologia -, através de observações e materiais analisados cuidadosamente.
Acreditou na teoria de Copérnico (de que os planetas giram em torno do Sol) desde o começo, mas foi apenas quando encontrou a evidência necessária à sustentação da hipótese que ele passou a defendê-la publicamente. A teoria Aristotélico-Ptolomaica foi destruída em 1609, no ano em que Galileu começou a observar o céu à noite, através de um telescópio que acabara de ser inventado. Galileu recebeu um telescópio de presente de um diplomata recém-chegado da Holanda, inventado um ano antes por um especialista em ótica e lentes. Galileu construiu um telescópio mais potente, usando lentes de qualidade superior que ele mesmo fez. Em Veneza, mostrou-o para o Senado, tentando vendê-lo como instrumento militar. A invenção rendeu-lhe uma cátedra permanente na Universidade de Pádua e salário dobrado. O telescópio revelou-lhe coisas que nenhum homem jamais havia visto. Ao focalizar o planeta Júpiter, Galileu descobriu que ele era acompanhado de vários pequenos satélites, ou luas que giravam à sua volta. Isto implicava que nada precisava necessariamente girar em torno da Terra. Observou que a superfície da Lua era marcada por crateras e montanhas, vislumbrou os anéis de Saturno, embora não tenha reconhecido o que era.
            Em 1610, Galileu reuniu suas observações num livro, cujo título pode ser traduzido do latim tanto como Mensagem das estrelas quanto como Mensageiro das estrelas. Religioso, queria também reeducar a Igreja, ajudá-la a reavaliar sua concepção do universo ainda aristotélica e geocêntrica. Em 1613, publicou um livro sobre outra descoberta que abalava a concepção aristotélica: as manchas solares. O Sol é ocasionalmente coberto por algumas manchas negras, que se movem sobre sua superfície e desaparecem após algum tempo.
Escreveu os dois livros em italiano (não o Latim acadêmico costumeiro), e em pouco tempo suas opiniões se tornaram amplamente difundidas além das universidades. O fato contrariou os professores aristotélicos, que se uniram contra ele, tentando persuadir a Igreja Católica a banir o copernicismo. Preocupado com isto, viajou para Roma em dezembro de 1615, tentar convencer as autoridades eclesiásticas de suas idéias. Argumentava que a Bíblia não pretendia se manifestar quanto a teorias científicas. Mas a igreja, temendo um escândalo que pudesse minar sua luta contra o protestantismo, tomou medidas repressoras. Em 1616 o cardeal Bellarmino, mestre de questões controversas do Vaticano e o teólogo mais influente da época, declarou "falsa e errônea" a doutrina de Copérnico, proibindo Galileu de "defendê-la ou sustentá-la". Galileu se sujeitou à decisão. Ironicamente foi a insistência de Galileu que forçou a Igreja a adotar uma posição oficial contra Copérnico: seus livros foram censurados pela inquisição. A partir de então, qualquer menção ao Sol como centro do cosmo era vista como heregia.
Em 1623 um velho amigo, o cardeal Mafeo Barberini, tornara-se papa Urbano VIII. Imediatamente Galileu tenta revogar o decreto de 1616. Após uma série de audiências, falha, mas consegue autorização para escrever um livro discutindo tanto a teoria de Aristóteles quanto a de Copérnico, embora com duas condições: não tomar partido e chegar a conclusão de que o homem não pode, em caso algum determinar como funciona o mundo, porque Deus poderia ter realizado os mesmo efeitos de maneiras inimagináveis pelos homens, que não podem fazer restrições à onipotência divina.  O livro Diálogo sobre os dois sistemas principais do universo foi concluído e publicado em 1632, e imediatamente acolhido em toda a Europa como uma obra-prima de literatura e filosofia. A palavra “diálogo” no título reflete a estrutura do livro. Escrito como uma discussão filosófica entre três pessoas cada uma com um papel específico. O primeiro Salviati, defende as idéias de Galilei. O segundo, Sagredo é um interlocutor inteligente e leigo (ou seja, o público), que em gera concorda com Salviati. O terceiro Simplício, representa os aristotélicos e é constantemente humilhado pelos argumentos de Salviati. O Dialogo é mais uma obra de popularização do que um tratado científico. Galileu não oferece nele nenhuma prova conclusiva a favor de Copérnico. E, para atingir o público leigo, apresenta uma versão extremamente simplificada da teoria copernicana, desconsiderando a reforma do sistema heliocêntrico realizada por Kepler. Ao final do debate, Galileu introduziu, numa fala de Simplício, uma frase do próprio Urbano VIII. Quando encorajou o cientista a apresentar o sistema copernicano, o papa afirmou que o fato de uma hipótese explicar bem certos fenômenos não significava que ela fosse necessariamente verdadeira, porque Deus podia muito bem ter produzido os mesmos fenômenos por meios totalmente diferentes e incompreensíveis para a mente humana. Sem citar nominalmente o papa, Simplício afirma que esse argumento provinha "da mais eminente e douta pessoa, diante da qual era preciso cair em silêncio".
            A ironia passou despercebida pelos olhos do censor eclesiástico. Mas Urbano VIII ficou uma fera ao tomar nas mãos o livro impresso e reconhecer suas palavras na boca do tolo Simplício. Em breve o papa, , arrependeu-se de ter permitido a publicação. Argumentava ele, que embora do livro tivesse as bençãos oficiais dos censores, o autor desacatara, ainda assim, o decreto de 1616. O livro foi proibido alguns meses após ter sido impresso, e as cópias já vendidas foram confiscadas pela Inquisição. Felizmente algumas já haviam escapado da Itália. Em 1633, Galileu com 69 anos foi condenado pelo Sagrado Tribunal da Inquisição e forçado a renunciar publicamente, sob pena de tortura, ao copernicismo. Sua pena incluía prisão domiciliar perpétua e ler salmos diariamente durante três anos. Como a visão enfraquecida não lhe permitia a leitura sua filha freira foi incumbida de ler os salmos em sua presença. Numa insuportável manifestação de arrogância, a Igreja humilhava o homem e se atribuía o direito de decidir o que a ciência podia ou não dizer.
Durante os nove anos seguintes, Galileu permaneceu ativo, pesquisando e realizando experimentos. Galileu permaneceu um piedoso católico, mas sua crença na independência do saber criativo não foi abalada.  Quatro anos antes de sua morte, ainda detido em sua casa, o manuscrito de seu segundo livro de fôlego foi mandado clandestinamente a um editor na Holanda. Este trabalho, intitulado Duas novas ciências, mais do que seu apoio às teorias de Copérnico, foi a gênese da física moderna. Nele descreve o resultado de suas várias pesquisas sobre o movimento dos corpos e sobre as propriedades mecânicas dos corpos sólidos, enfatizando a importância da matemática e da experimentação nas ciências naturais.
Quando Galileu morreu, em 1642, sua obra estava sendo lida avidamente em toda a Europa, fomentando a grande revolução científica que ocorreria no final do século XVII. Dentre os leitores, encontrava-se o inglês Isaac Newton.

Roma, 22 de junho de 1633:
"Eu, Galileu, filho do falecido Vincenzo Galilei, florentino, de setenta anos de idade, intimado pessoalmente à presença deste tribunal e ajoelhado diante de vós, Eminentíssimos e Reverendíssimos Senhores Cardeais Inquisidores -Gerais contra a gravidade herética em toda a comunidade cristã, tendo diante dos olhos e tocando com as mãos os Santos Evangelhos, juro que sempre acreditei, que acredito, e, mercê de Deus, acreditarei no futuro, em tudo quanto é defendido, pregado e ensinado pela Santa Igreja Católica e Apostólica. Mas, considerando que (...) escrevi e imprimi um livro no qual discuto a nova doutrina (o heliocentrismo) já condenada e aduzo argumentos de grande força em seu favor, sem apresentar nenhuma solução para eles, fui, pelo Santo Ofício, acusado veementemente de suspeito de heresia, isto é, de haver sustentado e acreditado que o Sol está no centro do mundo e imóvel, e que a Terra não está no centro, mas se move; desejando eliminar do espírito de Vossas Eminências e de todos os cristãos fiéis essa veemente suspeita concebida mui justamente contra mim, com sinceridade e fé verdadeira, abjuro, amaldiçôo e detesto os citados erros e heresias, e em geral qualquer outro erro, heresia e seita contrários à Santa Igreja, e juro que no futuro nunca mais direi nem afirmarei, verbalmente nem por escrito, nada que proporcione motivo para tal suspeita a meu respeito".

Em 1638 a cegueira total atingiu Galileu. Escreve em carta para um amigo:

" Ai de mim! O vosso amigo e servo Galileu tem estado no último mês desesperadamente cego, de modo que este céu, por maravilhosos descobrimentos e claras demonstrações, alarguei cem mil vezes além da crença dos sábios da antiguidade, se reduzem, daqui por diante, para mim, a um diminuto espaço preenchido pelas minhas próprias sensações corpóreas"

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